"TERRE D'ANGE é um lugar de beleza sem igual. Diz-se que os anjos deram com a terra e a acharam boa... e que a raça resultante do amor entre anjos e humanos se rege por uma simples regra: ama à tua vontade. Phèdre é uma jovem nascida com uma marca escarlate no olho esquerdo. Vendida para a servidão em criança, é comprada por Delaunay, um fidalgo com uma missão muito especial... Foi, também ele, o primeiro a reconhece-la como a eleita de Kushiel, para toda a vida experimentar a dor e o prazer como uma coisa só. Phèdre é adestrada nas artes palacianas e de alcova, mas, acima de tudo, na habilidade de observar, recordar e analisar. Espia talentosa e cortesã irresistível, Phèdre tropeça numa trama que ameaça os próprios alicerces da sua pátria. A traição põe-na no caminho; o amor e a honra instigam-na a ir mais longe. Mas a crueldade do destino vai levá-la ao limite do desespero... e para além dele. Amiga odiosa, inimiga amorosa, assassina bem-amada; todas elas podem usar a mesma máscara reluzente neste mundo, e Phèdre apenas terá uma oportunidade de salvar tudo o que lhe é mais querido."
"Para trás ficaram Terre d'Ange e as intrigas palacianas, a Corte das Flores da Noite, os amados Delaunay e Alcuin, os amigos, patronos e tudo o que para Phèdre evoca a palavra "casa"... Para trás ficaram também a herdade e a familiaridade da sua ternura tosca, a gentileza das suas mulheres e a beleza das suas cantigas... Diante de Phèdre abre-se agora a incógnita de um destino de cativeiro às mãos do cruel Waldemar Selig, no ambiente hostil da sua herdade e das suas gentes... O desvendar da ameaça que paira sobre Terre d'Ange, dos planos de um poderoso comandante e dos traidores d'Angelines. Pela pena de Phèdre, afrontamos o Mais Amargo Inverno através da vastidão skáldica. O retorno a Terre d'Ange e a oportunidade de salvar tudo o que lhe é mais querido. Traição, guerra, desafio, imolação, amor e redenção. Logrará Phèdre fazerjus à Marca de Kushiel e concretizar esse sonho tão ansiado?"
Apresento-vos estes dois volumes juntos pois eles são, na verdade, apenas um volume na versão original. A SdE optou mais uma vez por dividir o volume original em dois e estou até tentada a agradecer visto que o original tem cerca de 1000 páginas. Não é que me assuste mas... não dá muito jeito para trazer na mala.
Na versão original esta saga terá 9 livros, 7 dos quais já editados e depois de terminada este leitura só posso dizer que aguardo com uma enorme expectativa a edição de todos eles em Portugal.
Se o mapa do mundo criado por Jacqueline Carey com base numa Europa algo pré-medieval/medieval, não é nada complicado e com a sua ajuda a acção se torna fácil de seguir em termos geográficos, o mesmo já não se pode dizer do sistema social e político, bem como do jogo de intrigas nos quais os personagens se movem e pelos quais somos por elas guiados. A sociedade de Terre d'Ange assenta em Casas de prazer que veneram a deusa Nammah e em outras organizações, famílias ou instituições que se dedicam aos diversos deuses - cada um deles protector de uma região e das famílias daí naturais e que deles descendem. Com aliados distantes, inimigos bem próximos, aliados que o não são e inimigos que não o são tanto, a intriga política é um elemento muito forte. Quase tão forte como o sexo e a sensualidade, presentes a cada página e em quase todos os elementos que constituem este mundo.
O nosso guia em Terre d'Ange é Phèdre, uma jovem vendida pela mãe ainda em criança e destinada a uma das casas de Nammah. Contrariamente a tudo o que seria de esperar, ela é alguém muito especial e é assim que acaba por ser educada por um fidalgo misterioso e que conhece o jogo político como ninguém. Com Alcuin, outro protegido do seu patrono, cresce com uma educação exemplar e tem uma infância feliz. Até que a sua natureza a reclama e ela mergulha no mais profundo da sordidez humana até o seu mundo mudar irremediavelmente.
Phèdre é misteriosa, inteligente, elegante na acção e no pensamento e magnetizante. Seduz-nos com uma languidez desarmante e que não deixa ninguém indiferente, criando uma ligação forte com o leitor. A forma como aceitamos aquilo que ela é, o que representa a sua natureza é... não sei explicar. Aceitamo-lo com uma naturalidade tão estranha que nem as descrições de sessões masoquistas (que estão escritas de forma muito elegante, devo dizer) chocam tanto quanto o esperado.
Além do narrador sedutor, penso que será fácil para qualquer leitor a identificação com diversos personagens. Eles são um dos pontos fortes desta narrativa, bem construídos e credíveis, humanizados ao máximo e, acima de tudo, misteriosos. Ainda que com uma dicotomia herói/anti-herói (ou personagem bonzinho/personagem mau) ainda algo presente, a estória não perde em nada com este facto pois a autora socorre-se de outros artifícios para nos surpreender. Ainda que o leitor possa esperar acções menos benéficas deste ou daquele personagem, a surpresa é uma constante dado que os acontecimentos sofrem reviravoltas marcantes e que nos levam a querer sempre saber o que se seguirá. A acção não é vertiginosa, desenrola-se a um ritmo próprio, constante mas não rápido que nos é benéfico porque nos permite conhecer dados, locais e personagens sobre os quais não nos poderíamos deter se o ritmo fosse mais marcado.
Por último, não posso deixar de referir o elemento que mais me prendeu, o elemento mágico destes livros. A linguagem. Há tanto tempo que não lia um livro assim, normalmente a linguagem é simples e fluída mas aqui... É fluída, é mas de simples tem muito pouco. A linguagem é como o narrador, têm pontos em comum e complementam-se simultâneamente. Atrevo-me mesmo a dizer que o narrador que temos diante de nós, com uma linguagem diferente perderia grande parte da sua identidade, do seu carisma e magnetismo. Jacqueline Carey teve o cuidado de usar uma linguagem cuidada e elegante, sensual e minimamente erudita (em algumas passagens) e que, se a princípio se estranha, acaba por se entranhar de tal modo que não queremos deixá-la. Esta linguagem marca e é marcada pelo narrador, atribui elegância à narrativa e seduz o leitor de forma quase mágica.
Adorei.
Um apontamento menos positivo para a tradução. A tradução no geral está bastante boa, não há erros de ortografia e não notei que houvesse falhas na adaptação de expressões idiomáticas nem nada desse género mas... Será que hoje já ninguém sabe conjugar verbos? Será assim tão complicado usar o presente do conjuntivo?
Numa época em que, vá-se lá saber porquê, as pessoas falam cada vez pior, ouvem os outros a fazê-lo constantemente e escrevem ainda pior do que falam custa-me ver que os livros começam a espelhar essa realidade (nem é pelo dinheiro gasto, é mesmo porque um livro é fonte de informação e saber). Principalmente quando a tradução de uma forma geral é boa, como é o caso... Não percebo mesmo como pode acontecer.
9/10
2 comentários:
Eu gosto tanto, mas tanto, desta autora, que fico sempre muito contente quando vejo que mais alguém partilha do meu gosto por estes livros :)
Acho que só lendo mesmo, para se perceber o fascínio. Posso garantir que os 2 volumes seguintes (falo dos originais) mantêm a qualidade e são tão viciantes como este.
Quanto à tradução, e tendo lido o original primeiro, posso dizer que tenho as minhas reticências em relação ao tom geral da coisa...
Pois é célia, tens razão, só lendo mesmo. Quanto á tradução, tenho que reconhecer que, infelizmente e apesar de andar a trabalhar para contrariar o problema, a minha alergia ao inglês se mantém. Apesar de o meu inglês já não ser tão selvagem como há uns tempos, continua a impedir-me de ler os originais. Ainda assim, penso que quem traduziu o livro deu o seu melhor e conseguiu transmitir um pouco da elegancia e magia da narrativa. O mau uso dos tempos verbais é que me mexe com os nervos. Sei que não é um tempo verbal ao qual, no quotidiano, se recorra mas... Enfim, gramática é gramática.
Espero ansiosamente pelos próximos volumes, fiquei com o bichinho da curiosidade bem desperto no que respeita a alguns aspectos.
Bjs
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